Rafael Achilles Marcelino
Universidade Federal de Lavras – 3rlab
Dentre as espécies de peixes cultivados no Brasil, a que possui maior produção e importância na aquicultura nacional é a tilápia (Oreochromis niloticus) cerca de 47% da produção nacional. Esta espécie proveniente da África foi introduzida em nosso país por apresentar rusticidade, grande adaptação a diferentes tipos de ambiente e sistemas de produção: ser resistente a enfermidades: suportar variações de temperatura e baixos níveis de oxigênio dissolvidos na água: se reproduzirem facilmente, ter rápido crescimento e baixo custo de produção: além de ser uma carne de excelente qualidade nutricional e elevado valor proteico.
A produção de tilápias em nosso país saltou de 95mil toneladas para 254 mil no período de 2007 a 2011. A expansão significativa dos cultivos de tilápias em nosso país é decorrente da utilização de tanques-rede nos grandes reservatórios nos Estados de São Paulo, Bahia, Alagoas, Ceará e Minas Gerais.
Com a crescente popularização na tilapicultura em nosso país, observa-se um aumento do número de produtores e uma maior intensificação dos sistemas de produção. O mais antigo e tradicional sistema de produção praticado no Brasil é o da criação de tilápias em viveiros escavados, sistema este que apresenta disponibilidade de alimento natural associado ao maior espaço físico, conferindo a esta espécie um maior conforto e maior resistência a enfermidades. O sistema intensivo em tanques-rede (figura 1), porém, é o mais comum no nosso território, sendo caracterizado por criações de altas densidades e alta renovação de água. Neste sistema, as tilápias são dependentes de rações mais completas do ponto de vista nutricional, submetidas a estresses físicos e ambientais derivados do manejo, seja por classificação, transferência ou transporte, além da baixa qualidade de água. O manejo inadequado associado a uma baixa qualidade de água resulta em queda de resistência do animal aos patógenos oportunistas e ao aparecimento de doenças, inclusive as de origem bacteriana, associadas ao aumento da mortalidade, queda de produção. O impacto econômico pode chegar ao valor de R$ 10 milhões/ano, decorrente da mortalidade de 5% da produção por agentes infecciosos.
Figura 1 – Tanque rede para criação de tilápias
Os patógenos coexistem com as tilápias no ambiente de cultivo e qualquer desequilíbrio causado pela alta densidade de estocagem, pela inadequada manutenção da qualidade da água (baixo nível de oxigênio dissolvido e elevados níveis de amônia tóxica e nitrito), má nutrição, manuseio incorreto (durante as despescas, transferências de peixes entre as unidades de cultivo e transporte de animal vivo), acúmulo excessivo de resíduos orgânicos (serve de reservatório e substrato para a multiplicação de bactérias e outros organismos patogênicos) nos tanques e viveiros, aumentam a incidência das enfermidades. Os fatores que influenciam a susceptibilidade das tilápias às doenças são: espécie ou linhagem envolvida; condições de qualidade da água e carga orgânica nas unidades de produção; estado nutricional das mesmas; e principalmente condições de temperatura da água, já que este fator influencia diretamente a resposta imunológica das tilápias. Por exemplo, em temperaturas mais baixas, ao redor de 16-18°C, a resposta imune das tilápias é reduzida e não há reação aos diferentes antígenos. A esta mesma temperatura, a atividade bacteriana também é reduzida. Com a elevação da temperatura ambiente, as bactérias retomam rapidamente a sua atividade quando comparada a resposta imunológica do peixe, o que irá aumentar a incidência de enfermidades durante a transição inverno-primavera, por exemplo. Tilápias cultivadas em temperaturas entre 23-32°C são mais resistentes às doenças, desde que manejadas adequadamente. O manejo inadequado, a má qualidade de água e o adensamento populacional (fatores estressantes) poderão favorecer o aparecimento, de doenças virais, bacterianas, fúngicas ou mesmo parasitárias. Este artigo tem como objetivo citar as principais enfermidades bacterianas que acometem a tilapicultura brasileira, assim como descrever sucintamente a epidemiologia, sinais clínicos, formas de diagnóstico, tratamento e controle dessas doenças.
Principais enfermidades bacterianas
As doenças bacterianas apresentam-se como um dos principais obstáculos sanitários e produtivos dentro da tilapicultura. Em condições normais de criação, as bactérias encontram-se na água sem causar qualquer dano à saúde do peixe. Porém, fatores ambientais, nutricionais, genéticos e sanitários interferem no ambiente de cultivo, tornando as tilápias mais susceptíveis a doenças, e fazendo com que estas mesmas bactérias, que coexistiam sem causar qualquer dano, provocassem um impacto direto na saúde do peixe, passando a agir como agente oportunista e desencadeando doenças.
Dentre as doenças bacterianas de maior impacto econômico na tilapicultura nacional, podemos citar: Síndrome da Septicemia Hemorrágica Bacteriana, causada por bactérias Gram negativas, principalmente do grupo das Aeromonas móveis; a Estreptocose. A importância de cada bacteriose pode variar conforme a severidade da infecção e estádio de produção.
Síndrome da septicemia hemorrágica bacteriana
Os agentes etiológicos associados aos casos da síndrome de septicemia hemorrágica bacteriana em tilápia, identificados por isolamento bacteriano são vários. Estas bactérias são componentes normais da microflora da tilápias, assim como do ambiente aquático. São considerados patógenos facultativos, ou oportunistas, que só irã causar a doença quando os peixes forem submetidos manejo inadequado, traumas, nutrição deficiente, má qualidade de água, entre outros fatores estressante.
Em termos gerais, os peixes afetados apresentam sinais de escurecimento, exoftalmia, anorexia e áreas hemorrágicas ou ulceradas nas nadadeiras peitorais e ventrais, e na região ocular (figura 2). Pode internamente ser observadas: a palidez hepática com presença de focos hemorrágicos nas superfícies viscerais e na cavidade celomática. Além destas lesões, podem ver visualizados necrose hepática, cardíaca, esplênica e da musculatura esquelética, assim como necrose do tecido hematopoiético renal. Como o nome indica, a infecção está associada a uma importante septicemia causada pelas bactérias Gram negativas. A síndrome pode manifestar-se e produzir perdas de 5 a 100% nas tilapiculturas.
Figura 2 – Úlcera causada por bactéria
Dentre os principais agentes etiológicos da síndrome da septicemia hemorrágica bacteriana, no Brasil há relatos de casos da enfermidade por Aeromonashydrophila e Edwardsiella tarda.
No próximo artigos vamos falar sobre mais enfermidades causadas por bactérias.