Diovana M. Santos
Universidade Federal de Lavras- 3rlab
O conhecimento sobre os vários fatores que interferem na qualidade da carne é de fundamental importância no sistema de produção, para que os produtores busquem maior eficiência e tenham condições de minimizar os efeitos negativos e de oferecer ao mercado produtos que atendam às exigências do consumidor. A qualidade dos produtos de origem animal pode ser percebida principalmente por seus atributos sensoriais como cor, textura, maciez, sabor, odor, suculência, e nutricionais, tais como porcentagem de proteínas, vitaminas e minerais, quantidade de gordura e perfil de ácidos graxos. Durante as várias etapas de produção é possível controlar alguns desses fatores, através de fatores intrínsecos (escolha de raças/linhagens, gênero e idade do animal e ainda qualidade de instalações, nutrição e manejo).
A precocidade dos animais é um dos primeiros fatores a ser analisado, se trata da velocidade com que o animal atinge a puberdade (cessa o crescimento ósseo, diminui a taxa de crescimento muscular e aumenta a deposição de gordura na carcaça. O grau de acabamento da carcaça (espessura de gordura subcutânea) deve ser de pelo menos 2,5 a 3 mm para proteger a carcaça do resfriamento (figura 1). Esse isolante térmico natura ajuda a prevenir a desidratação, escurecimento e endurecimento da carne. A precocidade também determina a porcentagem de gordura intramuscular, que é a última a ser depositada, influenciando diretamente na maciez e sabor do produto final.
Figura 1- Classificação dos acabamentos de gordura de acordo com as 5 categorias.
Ainda nos fatores genéticos, outro ponto importante é a relação de enzimas calpaína/calpastatina, a capaína é a principal enzima responsável pelo amaciamento da carne no processo pós-morte, já a calpastatina é o seu inibidor. Animais com maior atividade da calpastatina tem carne mais dura em relação aos animais com maior atividade da calpaína na hidrólise proteica muscular.
O estresse pré-abate pode ser um fator importante na qualidade da carne, durante esse processo as reservas de glicogênio dos músculos do animal pode ser parcialmente ou totalmente utilizadas, e em consequência disso o rigor mortis se dá na primeira hora após o abate (provavelmente antes de ser levada à câmara fria) e então a reserva energética não será suficiente para manter o metabolismo anaeróbio e produzir ácido lático capaz de fazer baixar o pH a 5,5 na 24a. hora post mortem. A carne resultante desse processo terá pH>5,8, que fará com que as proteínas musculares tenham uma alta capacidade de retenção de água, mas será escura, com vida de prateleira mais curta, que se dá porque na ausência de ácido lático e glicose livre as bactérias utilizam os aminoácidos da carne com produção de odores desagradáveis, essa carne com pH alto também pode apresentar uma descoloração esverdeada, causada por bactérias que produzem H2S. Esse tipo de anomalia é chamada de “Dark-cutting beef” (carne bovina de corte escuro) ou DFD (“dark , firm and dried”, ou escura, firme e seca).
Durante a maturação (figura 2), que é um processo de resfriamento da carne (normalmente durante 8 dias até algumas semanas após o abate), a carne torna então mais macia. A maturação, a fim de evitar a proliferação microbiológica e odores desagradáveis, é feita sob baixa temperatura e na ausência de oxigênio. Durante o período da maturação, enzimas agem sobre as fibras musculares tornando a carne mais macia, mantendo ainda a textura característica da carne. Outras alterações também ocorrem durante a maturação, como a queda do pH que libera cálcio e altera as características das proteínas e o efeito dessas transformações é uma carne mais macia.
Figura 2- Carne fresca à esquerda e carne maturada à seco, à direita.
Além desses fatores, os métodos de cocção têm impacto direto na qualidade final da carne, quando adotado um método inadequado, todos os esforços posteriores na cadeia de produção podem ser perdidos, podendo por exemplo endurecer, ressecar e promover perdas de sabor e aroma. A temperatura, a presença ou não de umidade, o tempo de cozimento e a temperatura final no interior da carne são importantes variáveis que devem ser controladas de acordo com o tipo de músculo, para se aproveitar ao máximo as propriedades de cada corte. É importante saber que alguns cortes, com menor teor de colágeno, como o filé, contrafilé e alcatra, devem sofrer uma cocção rápida com calor seco, até 62-70°C, enquanto outros com maior teor, como o coxão duro, acém e músculo, devem ser cozidos na presença de líquido (ou vapor), que pode ser o da própria carne embalada em material impermeável, pelo tempo necessário para gelatinizar o colágeno.