1. INTRODUÇÃO
As vacas que entram no período de transição – três semanas antes até três semanas depois do parto, estão numa fase crítica. As mudanças que ocorrem durante este período as impõem enormes demandas fisiológicas. As práticas de alimentação e manejo usadas nas últimas semanas de gestação afetam profundamente a incidência de doenças no início do período de lactação (Olson, 2002).
Desta forma, neste artigo iremos discorrer alguns dos pontos importantes da alimentação e manejo da vaca em transição e início da lactação.
2. MANEJO NUTRICIONAL NO PERÍODO SECO
Uma das melhores maneiras para revertermos o quadro da produção leiteira atual é a adoção correta das técnicas alimentares específicas para cada fase do processo produtivo, dentre estas podemos destacar as vacas secas, que na maioria das vezes são esquecidas pelos produtores, pois, por elas não estarem lactantes, não contribuem para o aumento direto do lucro líquido da propriedade.
O programa das vacas secas inicia o próximo ciclo de lactação, exercendo uma grande influência na ocorrência de desordens metabólicas (cetose, deslocamento de abomaso, síndrome da vaca gorda e febre do leite), na mudança da condição corporal, no fornecimento de nutrientes necessários ao rápido crescimento do feto e na otimização da reprodução na próxima lactação. Desta forma um correto programa de vacas secas resultaria em um adicional de 200 a 1400 litros de leite na lactação posterior.
O período seco deve durar 60 dias a fim de permitir uma boa regeneração das células epiteliais desgastadas, um bom acúmulo de colostro e assegurar um bom desenvolvimento do feto, bem como completar as reservas corporais, caso estas ainda não tenham ocorrido.
Assim sendo, as vacas no período seco devem ser agrupadas em dois grupos bem distintos: o primeiro grupo abrange todos os animais que iniciam o período de repouso, que vai da primeira a quinta ou sexta semana, enquanto que o segundo grupo abrange os animais nas duas ou três últimas semanas que antecedem o parto. Uma das maiores razões que explica a necessidade e a vantagem de se ter dois grupos diferentes para as vacas secas, é a de que se deve levar em conta a diminuição do consumo entre os dois grupos.
Deste modo, no início do período seco os animais podem ser alimentados com uma pastagem de boa qualidade, feno, silagem e ou a combinação destes, no entanto, no final do período seco onde ocorre um grande aumento no crescimento fetal, existe uma elevação da pressão interna nos órgãos digestivos, diminuindo desta forma o espaço ocupado pelos alimentos, este fato, associado com a grande variação hormonal no período pré-parto, ou seja, um aumento nas concentrações sangüíneas de estrógeno e corticoídes e uma queda nas concentrações de progesterona (Chew et al., 1979), reduz o consumo de matéria seca em até 30%, predispondo o animal a um balanço energético negativo (Figura 1), com isso aumenta o catabolismo de gordura elevando as concentrações de ácidos graxos não esterificados em 2 ou 3 vezes na circulação (Grum et al., 1996; Van Saum, 2000), estes por sua vez, serão posteriormente acumulados no fígado podendo causar problemas metabólicos e diminuindo a posterior produção leiteira.
Uma das medidas básicas a ser tomada é a elevação da densidade energética da dieta no final do período seco (aproximadamente 21 dias antes do parto), aumentando conseqüentemente a relação concentrado: volumoso, compensando desta forma a redução no consumo dos alimentos (Figura 2). Aumentando a densidade energética da dieta de 1,30 para 1,61 Mcal ELL / kg de MS e a proteína bruta de 12,2 para 16,2% durante os 26 dias pré-parto resultou em maior ingestão de energia durante os 14 últimos dias pré-parto (21 vs 15 Mcal ELL/dia) e reduziu a gordura no fígado (9,0 vs 15,0 mg/ g de tecido seco) (Dyk et al., 1995 e Vandehaar et al., 1995).
O aumento do consumo de concentrado, além de adaptar os microrganismos do rúmen a uma dieta rica em amido, favorece o desenvolvimento das papilas ruminais (pequenas projeções em forma de dedo na parede ruminal) de 0,5 cm a 1,2 cm aproximadamente. As papilas são responsáveis pela absorção dos ácidos graxos voláteis e 50% da área de absorção do rúmen pode ser perdida durante as primeiras 7 semanas do período seco. A elongação das papilas após a reintrodução do concentrado leva algumas semanas (NRC, 2001). O crescimento das papilas aumenta a superfície de contato do rúmen possibilitando uma maior absorção dos ácidos graxos voláteis, promove pequena variação no pH ruminal e diminuição do risco de acidose no início da lactação, onde grandes quantidades de grãos são introduzidas na dieta.
Atualmente existe um substancial interesse em suplementar as vacas com gordura no período de transição. Diferente dos concentrados o aumento da densidade energética da dieta com a adição de gordura não parece aumentar a ingestão de matéria seca, diminuir desordens metabólicas ou aumentar a performance da posterior lactação. De acordo com Grummer (1999) o fornecimento de gordura na dieta durante o período seco inteiro pode ter diferentes efeitos no metabolismo do que durante as últimas 3 semanas antes do parto.
Recentes pesquisas têm mostrado que o aumento no fornecimento de proteína na dieta pode ter um efeito benéfico, principalmente porque mantém as reservas protéicas do animal, diminuindo a suscetibilidade às desordens metabólicas, mas não devemos esquecer de atender as exigências em proteínas não degradáveis no rúmen (Tabela 1).
A adição de 0,45 – 0,70 kg de gordura na dieta pode aumenta a ingestão de energia pelo animal (Hutjens et al., 1996), isto pode ser feito fornecendo aos animais de 2 ao no máximo 3 kg/vaca/dia de caroço de algodão ou soja em grão. Quantidades maiores destes alimentos podem provocar uma diminuição na ingestão de matéria e teor de gordura no leite (Palmquist, 1993).
Vitaminas, minerais e outros aditivos são bastante úteis na alimentação das vacas secas. A niacina que é um termo genérico do ácido nicotínico faz parte do sistema de coenzimas que atua no metabolismo de carboidratos, lipídeos, proteína, formação de ATP e regulação enzimática, desta forma a utilização de niacina na dieta pode prevenir a cetose, diminuindo a formação de ácidos graxos não esterificados, mantendo o nível de glicose no sangue e o consumo de matéria seca (Hutjens, 1992). A recomendação atual é fornecer de 6 a 12 gramas de niacina por dia, iniciando 21 dias antes da data provável do parto até o 30° dia de lactação, principalmente para vacas de alta produção (> 32 Kg leite/dia) e vacas de primeira cria produzindo acima de 25 Kg/dia, bem como as vacas obesas.
Assim como a niacina, o propilenoglicol pode ser fornecido na base de 150 a 200 g/dia, pois o mesmo é convertido em glicose no fígado, diminuindo a cetose e a formação do fígado gordo (Remond et al., 1984).
Devemos ainda considerar que a imunidade das vacas é menor no período pré-parto e no início da lactação, onde o aparelho reprodutivo ainda se encontra aberto e as taxas de infecção de mastite são altas, com isso o fornecimento de vitamina E, zinco, cobre e selênio pode ser benéfico evitando problemas como mastite e retenção de placenta. Feno ou outro volumoso com bolor, não deve ser fornecido as vacas, pois pode afetar o sistema imunológico e a resistência à doenças das mesmas.
No início da lactação, principalmente em vacas de alta produção, existe um elevado fluxo de cálcio para a glândula mamária, reduzindo o teor de cálcio sangüíneo e como conseqüência predispõe a vaca uma hipocalcemia, o que afeta até 75% das vacas de alta produção, segundo estudos realizados na Flórida e no Colorado (EUA). Níveis reduzidos de cálcio no sangue pode levar a retenção de placenta, involução uterina ineficiente, diminuição na contração do músculo liso e um aumento na incidência de deslocamento do abomaso. Desta forma, a utilização de sais aniônicos no pré-parto pode evitar a hipocalcemia aumentando a mobilização de cálcio nos ossos (Tabela 2). No entanto, devemos ter cuidado pois os sais aniônicos não são palatáveis podendo reduzir o consumo de alimento, logo a utilização de palatabilizantes pode ser necessária.
A Tabela acima mostra que houve redução significativa no aparecimento da febre do leite, toda vez que se administrou dieta aniônica no pré-parto as vacas leiteiras.
Um outro ponto importante que deve ser levado em consideração é a condição corporal das vacas próximo ao parto. Na Fazenda Experimental de Iguatemi da UEM, é adotado o método de avaliação da condição corporal de 1 (muito magra) e 5 (muito gorda). Sendo que para o parto o ideal é que a vaca se apresente com escore de 3,5 a 3,75.
Desta forma, as vacas bem condicionadas consomem mais alimentos, logo após o parto, não necessitando assim mobilizar grandes reservas corporais (Mattos, 1995).
Inúmeras pesquisas têm mostrado que vacas supercondicionadas consomem menos alimentos no pré-parto e no pós-parto, apresentando uma alta incidência de problemas metabólicos, existindo uma alta correlação entre condição corporal no pré-parto e consumo de matéria seca no dia 1 e 21 pós-parto. Grummer (1995) verificou que o supercondicionamento no momento do parto foi correlacionado negativamente com a ingestão de matéria seca 21 dias pós-parto. Esta constatação vai além de afetar a ingestão de matéria seca, pois os dados de Domecq et al. (1997), apontam para uma queda de produção de leite nos primeiros 120 dias de lactação para as vacas supercondicionadas.
Na Figura 3 podemos verificar que vacas magras (escore 3) e moderado (escore entre 3 e 4) mantiveram a ingestão de alimentos até os dias próximos ao parto quando comparado às vacas obesas (escore > 4) (Grummer, 1999). Logo, a obesidade pode ter efeito tão nefasto quanto à falta de condição corporal no momento do parto.
Podemos concluir que uma boa alimentação das vacas secas otimizará a rentabilidade e a saúde do rebanho.
3. MANEJO NUTRICIONAL NO INÍCIO DA LACTAÇÃO
As vacas recém-paridas têm que proporcionar rendimentos elevados. Depois do parto, se espera que as fêmeas bovinas leiteiras atinjam o pico da produção rapidamente e que concebam uma nova cria nos primeiros 85 dias de lactação. Isto se constitui num formidável desafio. Além do que, a capacidade de uma vaca para alcançar esta meta aumenta com um adequado manejo nutricional durante o período de transição de seis semanas (Olson, 2002).
Uma série de adaptações fisiológicas ocorre nas vacas leiteiras no início da lactação, objetivando sempre a produção de leite em detrimento a outras atividades metabólicas, tais como: a mantença, o crescimento e a atividade reprodutiva. Essas características estão relacionadas com as mudanças nas concentrações séricas hormonais favorecendo o suprimento de nutrientes para a glândula mamária em detrimento a outros tecidos (Matos, 1995) comumente chamado de homeorrese (Bauman & Currie, 1980).
Dentre as adaptações poderíamos mencionar um aumento na ingestão de matéria seca, produção de leite, atividade enzimática do tecido hepático (Aiello et al., 1984) e no suprimento de precursores gluconeogênicos (Baiard et al., 1980). Segundo Beede (1998) as dietas para vacas de alta produção e no início de lactação deveriam conter de 1,72 a 1,74 Mcal ELL/kg de matéria seca. O NRC (2001) preconiza 17 a 21% de FDA e 28% de FDN.
Logo após o parto a ingestão de matéria seca aumenta dia após dia até chegar ao ponto máximo por volta da 10ª a 12ª semana de lactação, enquanto o pico de produção de leite ocorre por volta de 4 a 6 semanas pós-parto (NRC, 1989). Esta diferença na curva de produção de leite e ingestão de matéria seca faz com que o animal experimente, durante um período de ± 60 dias, um desequilibro nutricional negativo (Santos et al., 1993), devido à mobilização de reserva corporal acumulada no final da lactação ou período seco, alguma proteína muscular e ou cálcio dos ossos (Matos, 1995) (Figura 4).
Portanto, uma vaca ao parto deverá ter reserva, em torno de 10% de seu peso a fim de fazer face ao déficit nutricional comum no início da lactação.
A fase mais crítica na vida da vaca leiteira se situa nos primeiros 21 dias de lactação, onde ocorre a maior intensidade de mobilização de gordura e em menor proporção proteína corpórea, principalmente tratando-se de vacas de alta produção (Chilliard et al., 1983).
Uma vaca de 600 kg de PV deverá ter um adicional de 60 kg de reservas corporais. Cada kg de PV corresponde em torno de 5 mcal de energia líquida lactação e 320 gramas de proteína. Levando-se em conta que as necessidades de produção de um quilo de leite se situam a 0,74 mcal de energia líquida lactação e 90 gramas de proteínas brutas (PB), esta vaca tem em “reserva” o equivalente a 405 kg de leite (base energia), ou seja (60 x 5/0,74) e em torno de 213 kg de leite com base na proteína (60 x 320/90) (NRC, 1989). Com isso, a vaca de alta produção possui quase 2 vezes mais reservas energéticas do que reservas protéicas (Santos et al., 1993). A perda de peso vivo da vaca no início da lactação está intimamente ligada com a capacidade individual de produção, uma vez que o animal mobiliza a sua reserva corporal para alcançar o seu potencial de produção, resultando em perdas de peso consideráveis (Tabela 3). Assim sendo, a avaliação regular da condição corporal dos animais é uma das melhores formas de controlar o desempenho dos animais em lactação e com isso fazer os ajustes nutricionais necessários (nível de energia, proteína, minerais e vitaminas) para cada fase da lactação.
Portanto, na primeira fase de lactação a perda de peso vivo deve ser inferior a 1 kg/dia; ou o equivalente a uma unidade no escore de condição corporal (escala de 1 a 5) aproximadamente 57 kg do peso corporal nos primeiros 60 dias pós-parto (Chase, 1992). Para se ter uma idéia do total de leite que uma vaca deixa de produzir, em função da má condição corporal ao parto (abaixo do escore 3), basta multiplicar o valor da produção de leite obtida no pico da lactação pelo índice 230 para vacas e 250 para novilhas. Teremos assim, o potencial de produção do animal, que ao ser confrontado com a produção real obtida no final da lactação, nos dá uma idéia do quanto à vaca deixou de produzir em função da sua condição corporal (Soberanes, 1989).
Imediatamente após o parto, as necessidades nutricionais das vacas são bem mais elevadas: a composição química da ração total (volumoso + concentrado) da vaca de alta produção, em lactação deve estar por volta de 16 a 18% de proteína bruta, 17 a 22% de FDA e abaixo de 30% de FDN (CPAQ, 1987; NRC, 1989; NRC, 2001). Todavia, é necessário ficar atento a degradabilidade de proteína e a qualidade em aminoácidos, pois nesta fase a exigência de proteína não degradável no rúmen (PNDR) é da ordem de 35% e a de proteína degradável de 65%. Nos primeiros 21 dias de lactação, o NRC (1989) sugere que as dietas sejam ainda mais adensadas, da ordem de 18,5 a 19% de PB e 38-40% PNDR, objetivando compensar a baixa ingestão de matéria seca.
Desta forma, dietas com excesso de PB e/ou PDR, falta de carboidratos fermentáveis, ou sincronia de degradação da proteína e a disponibilidade de energia, promove grande concentração de uréia no sangue e excreção de uréia no leite e urina (Fergunson & Chalupa, 1989; Garcia-Bojalil et al., 1998).
Quando a dieta é deficiente em proteínas, ocorre uma diminuição de albumina que persiste por 2 a 3 semanas no pós-parto, sendo que alguns autores sustentam que não só a deficiência de proteínas na dieta, mas a demanda de aminoácidos para a síntese de proteínas no leite, reduz a síntese de outras proteínas e por isto as concentrações de albumina e hemoglobina diminuem na medida em que a lactação avança (Wittwer, 2000).
Contreras (2000) afirma que a diminuição das concentrações de albumina é produzida pela redução da capacidade de síntese no fígado, devido ao acúmulo de gordura que este órgão sofre no início da lactação.
Baixas concentrações de albumina estão associadas com a baixa produção de leite não somente em quantidade, mas também em qualidade, com baixo teor de sólidos não-gordurosos (Payne e Payne, 1987).
Nos rebanhos em que as concentrações de albumina estão dentro do intervalo de referência (29 a 41 g/L) por volta das 10 semanas pós-parto, observa-se uma maior produção de leite no período de lactação e melhor fertilidade que nos rebanhos em que estas concentrações se mantêm diminuídas (Contreras, 2000).
Tradicionalmente, o leite tem sido pago com base no volume e porcentagem de gordura. O diferencial de preço para porcentagem de gordura tem passado por alguns questionamentos nos últimos anos à medida que tem declinado, de forma cíclica, o consumo de leite fluído e de gordura nele contido. Porém, ironicamente, tem aumentado o consumo de produtos lácteos com valor agregado com níveis mais elevados de gordura, dando o equilíbrio necessário para o escoamento da gordura do leite. Todavia, à medida que o leite é mais apreciado por sua concentração em proteína, especialmente com o crescimento do consumo de leite in natura, cada vez mais, em muitas partes do mundo, se tem levado em conta a componente proteína presente no leite (Kertz, 2002).
4. MONITORAMENTO DO PERFIL METABÓLICO
Uma outra ferramenta que poderia ser utilizada para avaliar um animal individual ou rebanho associado com o status nutricional é o perfil metabólico dos animais. Por exemplo à concentração de ácidos graxos não esterificados (AGNE) está diretamente correlacionada com a intensidade do balanço energético negativo (Van Saun, 2000).
A concentração de AGNE no soro é o resultado da “quebra” da gordura corporal em resposta ao balanço energético negativo. Alta concentração de AGNE na circulação devido ao intenso balanço energético negativo resulta em um acúmulo de gordura, o qual está associado com alta incidência de desordens metabólicas (Cameron et al., 1998). Valores referência estão demonstrados na Tabela 4. A concentração elevada de AGNE no fígado de ruminantes é fator determinante da acumulação de triglicerídeos neste órgão, resultado da intensa lipólise, todavia, o fígado não pode aumentar a produção de VLDL, que são as lipoproteínas de baixíssimas densidades encarregadas de levar os triglicerídeos acumulados no fígado até os tecidos. Conseqüentemente, o fígado, acumula maior quantidade de triglicerídeos, tendo como resultado uma função hepática comprometida, baixa produtividade, redução na ingestão de alimentos e baixo desempenho reprodutivo em vacas leiteiras. Assim o metabolismo hepático eficiente dos ácidos graxos é necessário durante o período de transição para evitar as desordens metabólicas do fígado.
O uso de gorduras e óleos como suplementos nas dietas de vacas leiteiras se transformou em uma prática importante para aumentar a ingestão de energia líquida e assim diminuir a duração e magnitude do balanço energético negativo. Os efeitos da suplementação com gorduras na produção e composição do leite, ingestão e digestão foram extensivamente estudados. Entretanto, um número pequeno de estudos tem sido realizado para determinar os efeitos das gorduras dietéticas no metabolismo hepático das vacas leiteiras. Mudanças no metabolismo lipídico ocorrem durante o período de transição em vacas leiteiras. Grum et al. (1996) demonstraram que vacas alimentadas com dietas com alta gordura (controle: ELL = 1,27 mcal/kg de MS; alta-gordura: ELL = 1,44 mcal/kg de MS; alto-grão: ELL = 1,44 mcal/kg de MS) no período seco, tinham pouca acumulação de triglicerídeos no fígado (1,4%) comparado com aqueles alimentados com uma dieta controle (7,3%) ou uma dieta com alto- grão (5,9%). Estes autores sugeriram que ocorrem mudanças adaptativas no metabolismo de lipídeos em vacas leiteiras alimentadas com dietas com alta-gordura, tendo como resultado menor acumulação hepática de triglicerídeos no parto.
Olson (2002) recomenda que os produtores de leite utilizem quatro estratégias principais de manejo durante o período de transição para reduzir o risco de enfermidades e infecções depois do parto:
1. Prevenir a diminuição da concentração de cálcio no sangue ou soro (febre do leite). Com isto diminuímos também, a exposição das vacas de leite a outras enfermidades logo após o parto que pode reduzir as probabilidades de uma nova concepção e dar maior taxas de morbidade e de mortalidade. Os ajustes na ração da vaca seca próxima o parto que podem ajudar a prevenir a febre do leite incluem:
• Realizar análises de forragens para determinar o conteúdo de sódio, potássio, cloro e enxofre;
• Utilizar forragens com baixos níveis de potássio;
• Formular rações para vacas em transição com a diferença mais baixa possível e prática entre ânions e cátions;
• Não usar tamponantes até depois do parto, pois estes aumentam os ricos de febre do leite.
2. Evite o balanço energético negativo imediatamente depois do parto. O incremento da densidade energética da ração para compensar a redução na ingestão de matéria seca é crucial. De outra forma, as vacas podem entrar em um balanço negativo de energia severo, o que pode conduzir a uma mobilização excessiva de gordura que age em detrimento da função hepática, causando acetonemia ou síndrome do fígado engordurado. Deve-se estimular a ingestão de matéria seca oferecendo alimentos altamente apetitosos e evitando aglomeração das vacas.
3. Prepare o rúmen para as dietas ricas em concentrado que serão fornecidos depois do parto. As mudanças bruscas para as rações ricas em energia das vacas em lactação podem levar a acidose ruminal e por conseqüência a laminite. A adaptação da microflora ruminal as rações ricas em amido requer de três a quatro semanas. Devido a este período de ajuste, se deve iniciar a introdução de grãos durante as últimas semanas do período seco.
4. Minimize a queda da resistência imune do animal associado ao parto. As mudanças associadas com o parto podem suprimir o sistema imune das vacas. Depois do parto, os níveis de vitamina E no soro sangüíneo podem baixar 47%, os de retinol 38% e os de zinco 67%, em relação aos níveis existentes antes do parto. O suplemento com vitamina E, vitamina A, cobre, selênio e zinco, pode ajudar a manter a função imune da vaca. O balanço energético negativo também tem um forte efeito imunosupressor.
Na Tabela 5 encontramos as metas anuais para as doenças mais comuns na pecuária leiteira.
5. BALANÇO ENERGÉTICO E REPRODUÇÃO PÓS-PARTO
As vacas leiteiras de alta produção, logo após o parto necessitam ingerir grande quantidade de energia para sustentar a síntese de leite que aumenta linearmente até 4 a 8 semanas pós-parto, chegando a um platô (pico de produção leiteira) e logo após começa um declínio semanal na produção leiteira até a posterior secagem do animal (Lucy et al., 1994). No entanto, no início da lactação existe um déficit de consumo entre os nutrientes exigidos para suportar a produção de leite e a ingestão de matéria seca, entrando em um quadro conhecido como balanço energético negativo (diferença entre a quantidade de energia líquida consumida e aquela necessária para mantença e produção) como foi visto anteriormente (Figura 4). Durante o período de balanço energético negativo as concentrações sangüíneas de glicose, insulina e IGF-I (fator de crescimento como insulina) estão baixas, assim como a freqüência de pulsos de GNRH e LH. E as concentrações de progesterona também podem ser afetadas pelo balanço energético. Estes metabólicos e hormônios têm sido apontados como responsáveis por afetar a folículogenese, ovulação e produção de esteróides in vivo e in vitro. O mecanismo exato pela qual a energia afeta a secreção de hormônios liberadores e gonadotrofinas não está bem definido, mas é claro que os menores níveis de glicose, IGF–I e insulina podem estar mediando este processo (Santos & Amstalden, 1998).
A severidade e a duração do balanço energético negativo estão relacionadas mais fortemente com a ingestão de matéria seca (r = 0,73) do que com a produção de leite (r = -0,25) (Villa-Godoy et al., 1988) e esta por sua vez com a condição corporal do animal ao parto (Butler, 2000).
Paralelo a todo este quadro de ingestão de matéria seca e produção de leite (balanço energético), temos o crescimento folicular, ovulação, fertilização e desenvolvimento embrionário, fatores estes, intimamente relacionados. Segundo Butler (2000) a intensidade do balanço energético negativo nas 3 a 4 semanas pós-parto está altamente correlacionado com os dias para primeira ovulação.
No final da gestação a hipófise anterior possui pequenas quantidades de LH e FSH devido ao forte “feedback” negativo das altas concentrações de estrógeno e progesterona no final da gestação, o qual diminui a produção de GNRH (Nett, 1987). No entanto, 7 a 10 dias após o parto as concentrações de FSH aumentam lentamente e estimula o desenvolvimento de uma onda folicular (Yavas & Walton, 2000) e o declínio do mesmo a seleção de um folículo dominante (Roche et al., 2000). Beam & Butler (1998) trabalhando com 42 vacas após o parto, testaram o efeito do nível de gordura na dieta (T1 = 4,8% de EE e T2 = 7,0% de EE) no crescimento folicular pós-parto e verificaram que uma onda de crescimento folicular ocorreu em todas as vacas do 8o. ao 14o. dia pós-parto, independente do tratamento.
Segundo Butler (2000) este folículo dominante formado durante a primeira onda de crescimento folicular pode tomar três caminhos bem distintos:
1º – Ovulação ;
2º – Atresia do primeiro folículo dominante e uma nova onda de crescimento folicular;
3º – O folículo dominante falha em ovular e se torna um cisto, sendo que este folículo anovulatório ou cístico prolonga a primeira ovulação pós-parto para 40 ou 50 dias.
A ovulação do primeiro folículo dominante ocorre 22,2 ± 8,7 dias pós- parto (Savio et al.,1990) ou 10 dias após ponto mais baixo do balanço negativo de energia (chamado NADIR) (Butler et al., 1981). Todavia, para este folículo ovular é necessário o estabelecimento de uma secreção pulsatil de LH, responsável pela produção de estrógenos, crescimento final e ovulação do folículo dominante (Roche et al., 1992). Sabe-se que a produção de LH é regulada fisiologicamente pelo GNRH produzido pelo hipotálamo (Roche et al., 2000) e a retomada dos pulsos de GNRH pós–parto é altamente dependente da intensidade do balanço energético negativo (Thatcher et al., 1996). De acordo com Santos e Amstalden (1998) e Butler (2000) quando as vacas estão em balanço energético negativo às concentrações de ácidos graxos não esterificados aumentam, e ao mesmo tempo, os níveis séricos de IGF-I, glicose e insulina diminuem, alterando desta forma os pulsos de GNRH, produção de estrógeno, LH e posterior ovulação (Figura 5).
Desta forma para otimizarmos a reprodução precoce de vacas leiteiras no período pós-parto é necessário fazer com as vacas percam o mínimo de peso e se recuperem rapidamente do balanço energético negativo.
6. MONITORAMENTO DA PRODUÇÃO DE LEITE
Em rebanhos manejados adequadamente, onde as vacas primíparas são agrupadas separadamente das multíparas, e têm acesso a uma dieta de transição bem formulada, há uma ocorrência mínima de animais com baixa produção, nos primeiros 3 meses do pós-parto. Nestes rebanhos, a produção diária de vacas primíparas nos primeiros 60 dias pós-parto deve representar pelo menos 70% da produção média deste grupo. Isso significa que, num rebanho com produção média diária no grupo de vacas em primeira lactação de 35 kg/dia, a produção diária no teste mensal dos animais nos primeiros 60 dias em lactação deve ser de pelo menos 24 a 25 kg/dia (Santos et al., 2001).
O pico de produção de leite está diretamente relacionado com a produção total durante a lactação. Estima-se que para cada quilograma a mais de leite no pico de lactação, a vaca irá produzir cerca de 150 a 300 kg a mais de leite durante a lactação completa. No entanto, essas respostas são distintas de acordo com o grupo de animais (Santos et al., 2001).
Animais de primeira lactação apresentam uma maior persistência de produção que aqueles em sua segunda ou em lactação superior. Define-se persistência como 1 menos a perda relativa de produção mensal após o animal ter atingido seu pico de produção. Geralmente, a persistência de produção de vacas de primeira lactação varia entre 92 e 96%, e a de vacas com mais de uma lactação entre 88 e 94%. Isso significa que o impacto do aumento de 1 kg de leite no pico de produção nas vacas de primeira lactação é maior do que aquele nas vacas com mais de uma lactação (Santos et al., 2001).
Da 11 a 20ª semana pós-parto o peso vivo fica estabilizado, a produção de leite começa a declinar e a ingestão de alimentos atinge o pico e a vaca, neste instante, já consegue ingerir todos os nutrientes que necessita para mantença e produção (Lucci, 1993), recuperando, desta forma, as reservas adiposas mobilizadas no início da lactação.
Nas últimas 24 semanas de lactação a ingestão de alimentos pelo animal atende facilmente as suas necessidades de mantença e produção e ainda sobram nutrientes para o ganho de peso, desta forma, a concentração de nutrientes pode ser reduzida para eliminar os desperdícios e evitar o caso dos animais excessivamente gordos e também minimizar os gastos com alimentação (Santos et al., 1993). Devido a esta mudança na produção de leite e a ingestão de nutrientes durante a lactação das vacas leiteiras as mesmas são divididas em fases, o que permite manejar e alimentar os animais corretamente.
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Algumas estratégias de manejo devem ser seguidas como:
I. Não permitir com que as vacas estejam magras ou super condicionada no momento do parto, pois vacas que parem mais gordas, tendem a consumir menos alimentos no pós-parto, precisando assim mobilizar mais reservas corporais, ficando então mais sujeitas aos problemas metabólicos, com prejuízo na produção de leite. Além do que, vacas magras no momento do parto (escore abaixo de 3) não possuem adequadas reservas de energia para suportar toda a lactação;
II. Maximização da ingestão de matéria seca: isto deve ser feito formulando corretamente a dieta dos animais. Mas isto só pode ser alcançado fornecendo uma dieta com volumosos de excelente qualidade e grãos com carboidratos altamente fermentáveis, assegurando sempre, um nível mínimo de ingestão de fibra. Sempre que possível, multiplicar o número de distribuição de forragens, ou fornecer as vacas Ração Total Misturada (RTM), onde grãos, tortas, fenos, silagem, minerais, aditivos e vitaminas são cuidadosamente misturados, o que assegura um fornecimento mais constante de elementos nutritivos as bactérias do rúmen além de evitar flutuações indesejáveis do pH do rúmen. Devemos sempre lembrar que o aumento de 1 kg de leite no pico de lactação representará 200 kg ou mais de leite em toda a lactação;
III. A adição de 0,45 – 0,70 kg de gordura na dieta pode aumenta a ingestão de energia pelo animal. Isto corresponde ao fornecendo de 2 ao no máximo 3 kg/vaca/dia de caroço de algodão ou soja em grão.;
IV. Fornecer dietas à vontade e manter espaço de cocho adequado para todos os animais;
V. Evitar o uso de uréia no início da lactação para as vacas de alta produção, recebendo dietas acima de 18% de PB, pois o excesso desta, entre outros prejuízos, altera a formação do tecido dos cascos, produzindo maior fragilidade dos mesmos;
VI. Todos os rebanhos sofrem algumas enfermidades e é impossível saber quais as taxas “normais” de doenças de modo que se possa comparar com os observados em seu próprio rebanho. Uma vez que se compara a taxa de incidência, se podem enfocar as áreas que necessitam melhorar.
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Quero um produto pra aumento d leite