Rafael Achilles Marcelino
Universidade Federal de Lavras – 3rlab
A reposição de novilhas em um rebanho leiteiro pode comprometer até 20% do gasto total deste rebanho. Elevar o consumo de energia na fase da pré-puberdade influenciará no ganho de peso, no crescimento das novilhas e na idade à puberdade. Entretanto este manejo pode ser mais custoso para o sistema, como também pode ter efeito negativo sobre o desenvolvimento da glândula mamária e assim comprometer a futura produção de leite.
O ganho compensatório é uma reação fisiológica do animal que passa por um período de privação alimentar devido ao manejo nutricional ou devido as influências climáticas cujas respostas em crescimento e/ou ganho de peso variam de acordo com tempo de restrição, idade, saúde inicial dos animais, tipo de dieta e potencial genético de ganho. Estas respostas vêm sendo estudadas ao longo dos anos em suínos; aves; bovinos de corte; cordeiros; equinos e pouco, mas também tem sido pesquisado, em novilhas leiteiras.
Este manejo pode resultar em maior ganho de peso e crescimento, podendo alterar a composição dos tecidos, melhorar a eficiência alimentar, melhorar a utilização da energia metabolizável da dieta, reduzir os requisitos de mantença durante o período de alimentaçäo adequada e melhorar a produção de leite futura.
O ganho compensatório pode ocorrer devido a mudanças no manejo alimentar. Pesquisas feitas com novilhas da raça Holandês (figura 1), com peso médio inicial de 205 e 172 kg, respectivamente, mostrou maior ganho de peso, menor consumo de matéria seca e melhor eficiência alimentar nas novilhas que passaram por restrição de energia na dieta do que nas novilhas sem restrição. O crescimento compensatório influenciou significativamente o desenvolvimento, a composição dos tecidos e o metabolismo dessas novilhas, reduzindo os requisitos de mantença e deprimindo a taxa do metabolismo basal.
Figura 1 – Novilha holandesa
Novilhas leiteras da raça Holandês e Pardo Suiço, respectivamente receberam alimentação com e sem restrição de energia na dieta e com e sem ionófor, foi-se observado que houve meor consumo de matéria seca, maior ganho de peso e melhor eficiência alimentar no grupo de novilhas que sofreram restrição alimentar por 90 dias, seguidos de uma realimentação de 60 dias. O grupo que receu suplementação com o ionóforo lasalocida o aumento de 12,2% na eficiência do crescimento das novilhas. As novilhas que passaram por restrição receberam neste momento uma dieta de baixa qualidade com maior teor de fibra e menor concentração de grãos. Durante a realimentação, elas receberam uma dieta com menor teor de fibra, maior proporção de grãos e sementes oleaginosas.
Reduzir o tempo da recria, faz com que as novilhas entrem na vida produtiva mais cedo podendo assim reduzir os custos de produção desta fase, entretanto, deve se controlar o consumo calórico nesta fase para que as novilhas não fiquem super condicionadas, pois este pode ser um fator determinante para o desempenho das vacas em lactação
O crescimento e o desenvolvimento da glândula mamária (figura 2) em novilhas leiteiras são cruciais para produtividade, sendo que o número de células epiteliais é o principal fator determinante para a produção de leite. A glândula mamária de uma novilha pode chegar a pesar 2 a 3 kg, sendo que 0,5 a 1 kg é considerado parênquima, o qual possui de 10 a 20% de células epiteliais, 40 a 50% de tecido conjuntivo e de 30 a 40% de tecido adiposo. Comparando com a glândula mamária de vacas em lactaçäo cujo peso pode chegar a 25 kg, o parênquima consiste em 40 a 50% de células epiteliais (ductos e alvéolos), 15 a 20% de lúmen, 40% de tecido conjuntivo e quase nenhum tecido adiposo.
Figura 2 – Esquema da glândula mamária e úbere de uma novilha
Estudos sobre o crescimento compensatório vêm indicando que alternar, durante 90 dias, o consumo de energia em 25 a 30% abaixo do recomendado pelo National Research Council (NRC), seguido de uma realimentação, durante 60 dias, com 20 a 30% acima do consumo de energia recomendado, pode ter efeitos positivos sobre a composição dos tecidos mamários e sobre a produção futura de leite.
Os efeitos do crescimento compensatório durante a fase de novilhas e a produção futura de leite foram estudados. Maior eficiência para produzir leite na primeira lactação foi observada em novilhas que receberam a partir de oito meses de idade, durante cinco meses, uma dieta restrita (valores 15% abaixo das recomendações do NRC) e depois realimentadas por dois meses com dieta 40% acima. Entre 15 a 17 meses de idade, essas novilhas foram novamente submetidas, durante cinco meses, à outra restrição alimentar, e uma realimentação por mais dois meses, visando o parto por volta dos 25 meses de idade.
O crescimento compensatório influenciou positivamente a produção de leite de novilhas leiteiras que aos 11 meses de idade sofreram restrição no consumo em 70% menos energia na dieta por três meses, seguido de dois meses com a realimentação de 130% a mais do recomendado pelo NRC. Possivelmente isto foi devido a maior concentração de DNA, RNA, proteína e menor teor de lipídeos em mg/g de tecido mamário analisado com 30 dias de lactação. A concentraçäo de RNAm da ßcaseína no tecido mamário foi 1,5 vezes maior para novilhas que sofreram restrição e a porcentagem de caseína no leite também aumentou 2,02 para 2.37% Antes do período de restrição, as novilhas receberam por dois meses uma dieta com 130% acima do recomendado para oito meses de idade. Cada molécula de caseína sintetizada na glândula mamária depende fortemente da concentração de RNAm da caseína acumulado no tecido mamário. Alternando as fases de restrição no consumo de energia e realimentação no manejo de novilhas do crescimento ao parto, é possível o aumento de até 150% do RNAm da ß-caseína no tecido mamário, 30 dias do pré parto das novilhas que tiveram restrição. A expressão do gene da caseína durante o final da gestação aumentou em aproximadamente 40% em relação ao grupo controle. Houve maior porcentagem de caseína leite, mas a porcentagem de proteína não alterou. As primíparas produziram 21% mais leite e na segunda lactação 15% a mais. As atividades das RNA polimerase I e II foram maiores nos tecidos mamários das novilhas que sofreram restrição alimentar. Este aumento foi estimulado pelo crescimento compensatório o qual interferiu na transcrição do gene (proteína do leite) nas células mamárias.